Marcos Troyjo
A atual fase da política exterior dos EUA é um exercício de introversão. Encolhimento da presença diplomático-militar no mundo. Menor interesse em Europa, América Latina e Oriente Médio. Suposta atenção prioritária à Ásia.
A Doutrina Obama contempla, como método, negociação sobre unilateralismo. Em
termos de foco regional, deslocamento para o Pacífico. A essência da doutrina,
contudo, reside em os EUA estarem mais voltados a si que a dilemas globais. Tal
introversão é escolha, não sinal de enfraquecimento relativo. Nenhum país
rivaliza com os EUA em forças convencionais, orçamento de defesa ou dissuasão
nuclear.
Com o desmantelamento da Al-Qaeda, os EUA veem-se menos confrontados pelos
"nanodesafios" geopolíticos que emergiram com o 11 de Setembro. Mediante a
utilização intensa de drones para ataques cirúrgicos, dão-se ao luxo de "voltar
para casa".
Já na grande geopolítica, Washington voltou a aceitar um mundo organizado em
esferas de influência. Evita tabuleiros de elevado risco. É o caso da Ucrânia.
Republicanos criticam a tíbia liderança de Obama. Estivessem à frente do
Departamento de Estado, pouco haveria de diferente. Mesmo o velho Kissinger tem
vocalizado contra intervenções nessas "esferas", como o entorno geográfico
russo. A propósito de eventuais intervenções, afirmou recentemente que "a gente
sabe como essas coisas começam, não como terminam".
O principal legado dos anos Obama até agora é o combate ao terror e a morte
de Bin Laden. Thomas Friedman brinca que "Obama é o drone mais rápido do Oeste".
Em nome desses objetivos, promoveu-se onda de espionagem mesmo junto a parceiros
tradicionais. A bisbilhotagem tirou peso moral de Washington. Os EUA são vistos
cada vez mais como cínicos –pouco comprometidos com transparência, democracia e
livre comércio.
A influência da política interna sobre a externa tem sido um pesadelo. A
colaboração Casa Branca-Congresso é nula. Obama fala mais com teleprompters do
que com parlamentares. Como nos EUA há dois partidos majoritários, mas inúmeras
facções, o jogo político é um balaio de gatos tão confuso quanto o nosso.
Resultado: Obama arrisca-se a não obter mandatos que o autorizem a concluir
acordos de comércio no Pacífico e no Atlântico.
A exemplo das relações com o Brasil, muitos intercâmbios bilaterais
murcharam. Nesse quadro, o Brasil oscila entre momentos de maior ou menor
interesse em Washington. Estamos num daqueles períodos de "desapontamento" com o
"no profile" da política externa brasileira e a percepção de que o sobe e desce
recente de nossa economia configura mais um voo de galinha.
As relações governo a governo com Brasília estão oceanos aquém das
oportunidades. Isso é muito ruim. Em comércio, investimento ou defesa, hoje não
há iniciativas de monta entre as duas maiores democracias do Ocidente.
Tal distanciamento representa um dos principais desperdícios de parceria do
mundo contemporâneo. E, no potencial irrealizado, perde mais o Brasil.
Fonte: Folha de S.Paulo - 09/05/2014
Nenhum comentário:
Postar um comentário